Por Lara Diana e Stephany Mariano.
Rodrigo Alves tem seu rosto facilmente reconhecido por muitos, principalmente pelos amantes de esporte. O jornalista começou sua carreira no Jornal do Brasil, onde passou pelas áreas de ciência, literatura e até política. Trabalhou também por 15 anos na Tevê Globo e é atualmente a voz, direção e edição por trás do podcast “Vida de Jornalista”. Um dos principais motivos de sua saída da grande mídia foi justamente poder se dedicar ao projeto do podcast.
Ele foi um dos convidados do Controversas de 2021, e tivemos a incrível experiência de conversar um pouco sobre jornalismo, e, mesmo através da telinha do computador, o jornalista nos contou suas experiências, sua trajetória desde recém-formado e se divertiu ao compartilhar algumas das histórias mais inusitadas que viveu na profissão.
Por que você escolheu o jornalismo?
Então, eu adoraria ter uma história linda, de inspiração, pra contar, mas foi muito aleatório o jeito como eu cheguei no jornalismo. Eu não tinha ninguém na família que era jornalista, nem conhecia ninguém. Não era uma coisa que estava na minha vida. E, quando chegou perto de entrar na faculdade, eu estava muito na dúvida sobre o que fazer. Mas aí tinham alguns amigos meus de escola que iam fazer Comunicação. Aí, como eu sempre gostei muito de escrever, fui pesquisar sobre como era o curso. Mas eu era muito tímido na época de faculdade, então Comunicação era uma palavra que já me assustava. Eu lembro que uns amigos do colégio riam quando eu falava que ia fazer Comunicação: “Como assim? Você nem fala direito aqui”. Mas era por causa da escrita, sabe? Eu queria escrever. E aí eu passei a me interessar mais pela profissão. E hoje, já tem 23 anos que eu me formei, não me vejo fazendo outra coisa, acho que é isso que eu vou fazer para sempre e acho que a escolha deu certo.
A sua primeira experiência como jornalista foi no Jornal do Brasil. Como foi esse período?
Essa foi uma história meio mirabolante porque ela começou quando eu estava no segundo período, e meu pai falou: “Ah, eu conheço um cara lá no Jornal do Brasil, então se você quiser, vai lá, pra tentar um estágio. E eu detestava isso, sabe? De ir por indicação. Ficava morrendo de vergonha. Aí acho que a Marília, que era a secretária do Jornal do Brasil, ficou meio com pena de mim. Ela falou: “Já que você tá aqui, se você quiser, eu falo com os editores, se você quiser passar a tarde aqui, vendo a redação, vendo como é que é”. E eu fiquei 6 meses fazendo isso. Eu ia para o JB todo dia, na redação lá na Avenida Brasil. Não ganhava nada e não fazia nada também. Eu ficava só olhando; ficava sentado, num canto, tentando captar as coisas que os repórteres faziam. Eu era tipo, estagiário do estagiário. Então, alguém ia fazer alguma pauta na rua, eu ia junto e não fazia nada, ficava só vendo.
Quanto tempo durou?
Aí depois de seis meses, eu arrumei um estágio na rádio da faculdade, e não conseguia mais ir para o JB. E o da rádio da faculdade me dava bolsa, então eu acabei saindo do jornal. Um ano depois, abriu a prova de estágio pro JB e eu fiz a prova. Entrei pela prova e aí eu comecei, de fato, a ser estagiário de verdade. E lá me contrataram. Fiquei 8 anos no Jornal do Brasil e foi uma experiência que, na real, me ensinou tudo: tudo que eu sabia até aquele momento era pela experiência do Jornal do Brasil. Em duas semanas de JB, eu já aprendi mais que na faculdade inteira. Não era o Jornal do Brasil dos anos 60, 70, o grande jornal brasileiro, mas ainda tinha muita gente boa: o Zuenir Ventura, o Veríssimo, o Xexéo; havia colunistas de muito peso, Dora Kramer; e muitos repórteres bons. Ali foi a minha grande escola.
Você chegou a passar um período fora do Jornal do Brasil, e quando voltou foi chamado para ser editor de política. Como foram esses anos?
Eu não fui chamado, fui obrigado, na verdade. Tinha uma crise financeira muito forte ali, todo ano tinha leva de demissão. E eu tinha saído do jornal, fiquei um ano fora: me chamaram para ser editor de uma revista do Centro Cultural Banco do Brasil, que chamava Veredas. Eu fiquei na revista Veredas como editor por um ano, foi minha primeira experiência como editor, aí a revista fechou. Geralmente os lugares por onde eu passo fecham. Eu tenho essa fama. Meu colégio fechou, minha faculdade fechou, o Jornal do Brasil fechou, a revista Veredas fechou. A Globo sobreviveu a minha passagem, está em pé ainda.
Ninguém ficava ali, porque tinha muita influência externa: o governo do Estado era quem anunciava no jornal, então você não podia falar mal do governo por ser o principal anunciante. Um dia o editor-chefe me chamou, e falou: “Olha, a gente quer que você seja o editor de política”. Eu tinha 24 anos, o que é uma loucura, né? Eu falei: “Então tá, vou pensar”. E ele falou: “Não, olha só, a gente vai entender como um pedido de demissão, se você não aceitar”. Eu falei “bom, demissão não tá no meu plano agora, né, então vamos lá”.
Para o jornal, eu não estava preparado para aquele momento ali. Mas foi uma experiência legal para a minha carreira, porque eu não esperava, não era uma área que eu queria trabalhar, mas eu aprendi meio na marra. E, às vezes, no mercado, a gente aprende meio na marra mesmo, não tem muito aquele plano perfeito. Foram dois anos e meio de pedreira, era bem complicado. Eu fiquei até sair do jornal.
E o que veio entre Jornal do Brasil e a Globo? Como foi sua entrada para a Globo?
Isso foi um intervalo bem rapidinho. Eu saí do JB, pedi demissão, justamente por causa dessas questões de interferência política do governador. Aí eu fiquei uns 6 meses fazendo freela. Isso foi em 2005. Em 2002, eu tinha lançado um blog de basquete, que era o Rebote. Aí quando eu saí do JB, o blog já era bem conhecido. Não era famoso, mas no meio do basquete eu era conhecido. Uns cinco ou seis meses depois, a Globo pegou os direitos de transmissão da NBA para a internet e abriram um processo para escolher um narrador e um comentarista. E aí me chamaram, eu fiz uns 3, 4 testes e passei: fui contratado para ser comentarista com o Roby Porto. A gente ficou 3 anos transmitindo 2 jogos por semana da NBA na internet.
Quando acabou esse contrato com a NBA, era 2008, e a Olimpíada de Pequim, ia rolar. Como eu já tinha essa experiência de ter sido editor do Jornal do Brasil, eles me colocaram como um dos editores da editoria de Esportes Olímpicos para comandar a cobertura da Olimpíada. Eu fiquei 15 anos no GE. Fui editor de esportes olímpicos por um tempo, e cobri a Olimpíada de Londres. Cobri a Olimpíada do Rio, como repórter, depois fui pro futebol, rodei para umas outras áreas, e aí nos últimos 3 anos o Sportv me chamou para ser comentarista fixo de basquete.
Você contou que fez a cobertura das Olimpíadas. Qual foi a experiência mais marcante que teve durante esse período?
Pra quem gosta de esporte e de jornalismo, cobrir uma Olimpíada não tem nada melhor, nem Copa do Mundo. Olimpíada é o planeta inteiro em uma cidade, são os melhores atletas do mundo naquele momento no mesmo lugar, na mesma vila olímpica, então é um evento concentrado com o que tem de melhor no esporte.
Eu trabalhei muito na Olimpíada de Londres, porque eu cobri como repórter e eu coordenava a equipe. A gente tinha uma equipe de três pessoas credenciadas e mais três sem credencial para cobrir coisas da cidade, então eu tinha que fazer a escala de todo mundo. Eu praticamente não dormi nesse período lá em Londres. Nem comi, nem dormi, isso aí só quando dava tempo, muito de vez em quando. O que não é bom, aliás: você tem que tentar se cuidar também, porque senão chega uma hora que você pifa.
Na Olimpíada do Rio a gente tinha 98 credenciais, então você podia credenciar a redação inteira porque a olimpíada era aqui. E, no Rio, me fizeram essa proposta que acho que todo o repórter gosta de ouvir: “Você quer ficar como repórter solto? Sem pauta. Você procura suas pautas, caça suas histórias e faz as suas matérias". Foi um momento muito legal, eu foquei muito nas histórias de países pequenos e atletas de países pequenos da Olimpíada. Na Olimpíada do Rio eu lembro de histórias que foram algumas das mais legais que eu já cobri na carreira, e eu guardo com muito carinho, foi um período muito legal.
Você agora tem o “Vida de Jornalista”, e antes teve a experiência de trabalhar com podcast com o “Dois pontos”, mas agora você trabalha sozinho. Você comentou no Controversas, evento de comunicação da UFF, um pouco sobre sua rotina com esse projeto, como tem sido produzir um podcast sozinho?
O “Dois Pontos” era quase sozinho também, éramos eu e o Raphael Roque, lá do GE [Globo Esporte]. Apesar de ser dentro da Globo, nós fazíamos tudo. No Vida, que surgiu, mais ou menos, na mesma época, ali em 2018, todas as etapas do processo sou eu que faço.
No fim das contas, acho que acabou sendo bom pra mim, por um lado, porque acabei entendendo melhor as etapas todas do processo, inclusive aquelas com as quais eu não tinha muita intimidade, como a edição: eu nunca tinha feito edição de áudio. O que eu tinha mais intimidade era fazer as entrevistas, porque eu sempre fiz entrevista. Mas fazer para áudio é diferente, editar é diferente, fazer essa produção é diferente, as gravações, às vezes remotas, que a gente faz, era tudo muito diferente. Então, dá um trabalho danado pra fazer, mas por outro lado eu também acho legal fazer sozinho, porque eu faço do meu jeito. Então, é tudo comigo. O processo inteiro é autoral.
Fala do processo de produção do Rio Memórias?
Agora, trabalhando com o Rio Memórias, que é o outro podcast que estou fazendo na produtora, eu tô fazendo com uma equipe. Mas aí é totalmente diferente, porque eu faço só os roteiros. No Vida foi um processo inteiro que fui tendo que aprender. O Vida, depois, passou a ser um podcast narrativo, o que aumenta ainda mais a complexidade, porque não é só gravar a entrevista e botar no ar. É construir um roteiro, ir gravando as locuções, montando as falas da pessoa pra ir costurando, usando muito áudio para ilustrar. Então, é uma coisa mais documental: ele tem mais uma cara de documentário em áudio que uma entrevista. Outro dia eu cronometrei as etapas todas do processo e eram 40 horas de trabalho para um episódio de 40 minutos. Hoje eu vou espalhando por duas semanas, porque agora é quinzenal. Mas eu gostei, porque foi uma maneira de entender o processo, sabe? Hoje, por exemplo, eu dou aula disso na oficina. Consigo ter uma ideia de como é o processo inteiro graças ao Vida, se não eu não saberia.
Você começou uma produtora de podcasts narrativos, o “Escuta Aqui”, como surgiu esse novo projeto?
Eu sabia que o Vida de Jornalista não ia me sustentar: não é um podcast que tem um rendimento pra me sustentar ainda. Tem a campanha de financiamento que cobre os gastos dele, mas não paga os meus boletos. Então eu sabia que ia precisar fazer outras coisas. Tem a oficina, que hoje é a minha fonte de renda principal.
Só que logo que eu saí da Globo, chegou uma proposta do Rio Memórias. E foi muito doido, porque eu nunca tinha feito. Não dá pra fazer 2 podcasts narrativos sozinho, então eu tive que primeiro pensar em qual equipe eu ia precisar pra fazer, quantas pessoas eu ia precisar trazer pra trabalhar comigo e quanto custaria cada um desses trabalhos. E aí rolou, surpreendentemente.Então eu montei essa equipe, eu e mais 4 pessoas. Como esse pagamento no Rio Memórias era um pagamento um pouco alto, que era pra eu receber e repassar pra equipe, só esse pagamento já ia chegar no limite do MEI. Então eu decidi abrir a produtora. Abri uma empresa mesmo. Que, na real, não tem uma equipe contratada, é uma equipe que eu vou contratar pra cada projeto.
E, por fim, quais são os planos para o futuro? Você tem algum projeto em mente?
Geralmente eu não fico fazendo muito plano, o meu plano é fazer jornalismo pra sempre. O que faço é tentar ficar muito atento ao que tá rolando, ao que tá surgindo de ferramenta nova, de plataforma nova, de maneiras diferentes de contar histórias. Foi assim com o podcast. Quando saiu a twitch, por exemplo, fui lá ver como é que é pra fazer o stream. Mas o que eu quero agora nesse momento é continuar fazendo podcast e pegar projetos que sejam legais, nos quais acredito para a produtora. Então, hoje, consigo falar que eu consigo viver de podcast. Não só o Vida, mas também de outras coisas relacionadas a podcast. É o que eu quero para agora e para o ano que vem. Daqui a 2 anos já acho muito longe, não sei.
Eu prefiro não ficar fazendo muito plano, mas não fazer plano não significa não pensar na carreira, sabe? Acho que a gente tem que pensar o tempo inteiro, se o que você está fazendo tá ok, se você tá feliz, se dá pra ir pra outra coisa, se tá surgindo alguma oportunidade nova.
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